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Clara Porset, uma cubana revolucionária para o design

A designer cubana Clara Porset (Foto: Reprodução).

Este artigo é uma homenagem à Clara Porset Dumas, desenhista industrial cubana pouco conhecida no Brasil. Com uma trajetória similar à de Lina Bo Bardi no Brasil, Clara Porset, também foi pioneira no desenho industrial, não no seu país, mas no México, ajudando a construir e a fortalecer a disciplina com um papel fundamental para o nascimento de um país moderno e inovador.

Cubana de nascimento (Matanzas, 1895-1981) Clara deixa Cuba em 1936, por motivos políticos, e viaja ao exterior para  estudar  Estética, História da Arte e Composição Arquitetônica na Columbia University (Nova York), Universidade de La Sorbonne e na Escola de Belas Artes de Paris, respectivamente. Depois de formada com a recomendação de Walter Gropius, estuda com Josef Albers no Black Mountain, Carolina do Norte; especializando-se mais tarde em design de mobiliário.

Empreendedora, obtém já naquela época o primeiro Prêmio Continental do Museu de Nova York, em 1941, com um projeto de mobiliário rural e a medalha de prata da Trienal de Milan, em 1957, com móveis de praia para hotéis de luxo.

Os seus estudos e práticas profissionais no exterior, com figuras destacadas do campo do design, arte e arquitetura, a colocaram em contato com pensamentos, tendências inovadoras do design da época, quando ela constatou, repetidas vezes, a importância do design no desenvolvimento produtivo/econômico de um país.

Depois de visitar o México, em 1940, decide fixar residência no país, onde se casa com o pintor Xavier Guerrero. Apesar de exilada, tinha uma formação de esquerda e a ideia de que o design deveria ser para todos, da classe alta aos trabalhadores. Sempre fiel sempre aos seus princípios, esse foi o eixo norteador de sua vida – o design para todos.

Clara Porset chega a seu novo país com uma sólida formação no campo do design de mobiliário e design de interiores, mas também chega a um país que vivia um momento histórico e cultural sem igual, depois da revolução de 1910, com um forte sentido de nacionalismo e resgate de sua cultura popular-artesanal.

Nesse contexto histórico único ela teve a oportunidade de conviver com intelectuais e mestres da arquitetura, muralismo, pintura, política, que procuravam desesperadamente por uma nova identidade nacional. Mestres como Luís Barragán, Pablo Neruda, Mario Pani, Enrique del Moral, Juan Sordo Madaleno e Diego Rivera.

Ao final dos anos 40 e princípios dos 50 havia muitos visionários como Juan O´Gorman, grandes pintores como Diego Rivera, mas nenhum personagem que explorasse esse novo caminho e importância do desenho industrial. Clara foi elemento vital e pioneira desbravadora nessa nova jornada.

Em seu novo país a sua atividade profissional foi rapidamente influenciada pela cultura artesanal, assim como aconteceu com Lina Bo Bardi no Brasil. Como Bardi, ela reconheceu a importância, o valor da cultura artesanal, dos seus processos e materiais particulares. Entendeu como essa riqueza “primitiva” não explorada poderia ser incorporada à linguagem do design, gerando assim uma nova cultura material, que poderia ser a resposta na busca de uma nova identidade nacional.

Clara Porset então desenvolve uma identidade mexicana com novas formas e conceitos em uma nova maneira de projetar design de mobiliário. Fusiona a sua experiência com a vanguarda européia, tendências do momento e o conhecimento e admiração que tinha pelas tradições mexicanas e a arte popular. Tinha afeição por formas orgânicas, uso de madeiras nobres e materiais como fibras naturais simples, concebendo um ambiente rústico, mas moderno para sua época.

Além dessa ebulição cultural, de esquerda principalmente, o país passava por um forte processo de urbanização e modernização, que exigia mobiliário urbano, arquitetura e design de interiores em todos os âmbitos e escalas. Clara, então, se encontrava no lugar certo, no momento certo.

Clara afirmava: “O mobiliário tem que ser como a arquitetura: uma expressão vivente que resulte do meio físico e cultural. O clima e o grau de desenvolvimento social, econômico e técnico de uma nação determinam necessariamente o material que se usa, a forma de trabalhá-lo e a aparência da forma.”

“Se a tudo isso se adiciona a força da herança cultural, poderosa como a do México, o que cabe é a expressão nacional que pode chegar a ter finalmente pelo seu mesmo mérito, valores internacionais”. Organiza em 1952, a exposição “Arte na vida cotidiana” foi a primeira exibição de desenho industrial e artesanato mexicano.

Profissionalmente, Clara desenvolve mobiliário e decoração de interiores para projetos privados e do governo, chegando a exportar para Europa e Estados Unidos.

Volta ocasionalmente a Cuba, nos anos 60, para a realização de mobiliário maciço a serviço da Revolução. Elabora também o programa de criação da Escuela Superior de Diseño Industrial, que estaria a cargo de Che Guevara, mas que não aconteceu.

Como acadêmica elaborou programas acadêmicos de Desenho Industrial no México e América Latina e fundou o curso de pós-graduação em Desenho Industrial na Universidad Autónoma de México. Foi uma promotora incansável do desenho industrial em revistas, jornais, livros.

Clara Porset falece em 1981 e seus restos mortais encontram-se na Cidade do México. Deixou como legado sua figura visionaria, empreendedora, inesquecível, exemplo para todas as futuras designers latino-americanas, a sua biblioteca e projetos pessoais para o Centro de Investigaciones de Diseño Industrial UNAM.

O próprio UNAM, como homenagem a uma de suas figuras máximas, cria o Prêmio Clara Porset para mulheres designers do continente.

Podemos então nos perguntar: foi Clara Porset uma das primeiras precursoras da ideia de um design sustentável e para todos junto com Lina Bo Bardi no Brasil? Pessoalmente acredito que sim.

Para saber mais sobre o Prêmio Clara Porset e como participar, clique aqui.

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