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O futuro da programação visual

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Nova proposta de ícone de acessibilidade, de Sara Hendren. (Foto: accessibleicon.org).

Antes de iniciar, vamos refletir sobre o tempo. Falar do futuro sempre causa ansiedade, euforia e um certo medo. A imprevisibilidade assusta.

A visão geral sobre esse ponto variável na linha do tempo parece ter uma cara definida. O que se vê é muito cinza, materiais frios, robôs convivendo com pessoas, respostas automáticas, alta conexão e carros voadores. De fato, muitas tecnologias já se concretizaram. Algumas aconteceram de formas diferentes às imaginadas no passado, mas realmente saíram no papel — e muitas continuam em processo de desenvolvimento.

Contudo, apesar do desconforto em, muitas vezes, imaginar o futuro ou a sua imagem pode não ser tão monocromática e fechada.

Antes da construção de qualquer produto, serviço ou ambiente, o que vale destacar é que as pessoas devem estar no centro da criação. Os problemas surgem delas e a solução vai para elas, a fim de que todos possam usufruir do resultado.

Mudanças estruturais na sociedade

O design, ao longo do tempo, passou por notáveis transformações, e acompanhou a ascensão de grandes tecnologias, que permitiram o aperfeiçoamento das produções.

Da serigrafia às máquinas de impressão digital, foi um processo proveitoso de inovação. As tecnologias trazem facilidade e agilidade ao trabalho.

Hoje, acompanhamos o crescimento da impressão em 3D. Vemos demonstrações de pequenos objetos para uso doméstico a casas compactas, de simples bonecos a órgãos humanos. A velocidade com que tudo acontece parece gerar certo receio ou, por outro lado, fascínio.

Casa construída em 24 horas, por meio de uma impressora em 3D. (Foto: revistacasaejardim.globo.com).

O fato é que tais tecnologias geram novos comportamentos. Todavia, não apenas elas alterarão as nossas vidas. A sociedade, à medida que cresce em conhecimento, ganha novos aspectos estruturais.

Vamos fazer um recorte no cenário brasileiro. Míriam Leitão, jornalista e apresentadora, em seu livro “História do Futuro — o Horizonte do Brasil No Século XXI”, de 2015, reflete sobre os avisos do tempo que projetam o futuro próximo. Ela destaca alguns pontos de grandes mudanças no Brasil. Dentre eles, está a demografia.

De acordo com algumas projeções, a população brasileira vai crescer até 2035. A partir de então, o índice vai começar a diminuir. Isso é explicado por inúmeros fatores. As mulheres, com mais poder sobre suas escolhas, vêm optando por não ter filhos. As pessoas também vão viver mais, pois o índice de expectativa de vida vai aumentar consideravelmente. O resultado de tudo isso é uma população com menos crianças e mais idosos.

Ainda parafraseando Leitão, a educação tem papel crucial para este panorama, uma vez que com mais conhecimento, mais se pondera sobre as decisões importantes da vida. A conectividade, originada por meio da era digital, trará avanços significativos ao ensino, tornando-o mais rápido, prático e dinâmico.

Outro ponto a ser destacado, diz respeito ao trabalho mais pesado, que será realizado pelas máquinas, substituindo as pessoas. Leitão afirma que “Não se brinca com a demografia. O que se pode fazer é entendê-la”.

Pictograma, à direita, criado pelo professor e designer Ciro Roberto de Matos, vencedor do concurso realizado pelo movimento Nova Cara da 3ª Idade, liderado pela agência digital Garage IM. (Foto: www.meioemensagem.com.br).

Sustentabilidade também é um tema em ascensão, e tem forte ligação com o design. Ezio Manzini, especialista em design sustentável, em seu livro “Design para a inovação social e sustentabilidade”, de 2008, aborda temas pertinentes relacionados ao consumo, à população, às tecnologias, às empresas e, principalmente, ao design e à sustentabilidade. O trabalho em conjunto vai ser imprescindível para o futuro. Para isto, muitos designers e empresas precisam deixar o orgulho de lado e construir projetos de modo colaborativo, com códigos abertos.

A ideia de consumo passará da posse ao compartilhado, baseando-se na criação de serviços e não apenas de objetos. As cidades, de um modo geral, sofrerão mudanças importantes. Haverá uma ruptura na política e na economia. A produção demasiada e desenfreada gera cada vez mais lixo, portanto, se faz necessário repensar nosso estilo de vida.

As novas tecnologias também facilitarão os indivíduos com deficiências específicas. Klaus Schwab, engenheiro e economista, em seu livro “A Quarta Revolução Industrial”, de 2016, indica algumas tecnologias pertinentes à nossa era, tais como a impressão em 3D, internet das coisas, dentre outras.

Para este artigo, em especial, reservo a reflexão a respeito dos carros sem a necessidade de motoristas, como o Google Car — agora chamado de projeto ‘Waymo’ — , os quais poderão trazer autonomia na mobilidade aos deficientes visuais, por exemplo. A impressão em 3D será capaz de construir partes faltantes de um corpo, de forma mais ergonômica e assertiva.

Novo protótipo do Google Car, criado em 2014 (Foto: waymo.com).

Em 2020, de acordo com o livro “The Future of Jobs” (O Futuro dos Trabalhos, em tradução livre), do Fórum Econômico Mundial, lançado em janeiro de 2016, o pensamento crítico, a criatividade, a empatia e a inteligência emocional aparecerão nas seis primeiras colocações de um top 10 de habilidades no ambiente de trabalho, acompanhados da gestão de pessoas e da solução de problemas complexos.

O que se pode notar, portanto, é que os comportamentos, influenciados por inúmeros fatores, irão desenhar uma nova forma de entender a sociedade, construindo novas tendências e necessidades.

O desenho de amanhã

As mudanças virão. Não há como fugir delas. Precisamos, antes de tudo, estar preparados para elas; aptos para projetar para um novo cenário.

O designer, mais do que nunca, deve atentar-se a estes acontecimentos importantes na sociedade. As mulheres ganham a cada dia mais espaço, as distâncias raciais são minimizadas por meio da luta contra o racismo, a expectativa de vida da população vem aumentando, a era digital está otimizando o processo de aprendizado e conhecimento e as minorias ganham cada vez mais voz.

Os idosos terão melhores condições de vida e serão mais ativos tanto no mercado de trabalho quanto economicamente, o que implica em novas adaptações cotidianas. O pictograma de um velhinho de bengala, que aparenta estar com dor nas costas, realmente representará o idoso do futuro?

O mesmo é válido para outras representações visuais. O símbolo de um cadeirante estático e dependente não representa mais o deficiente físico de hoje. Um fraldário em que se tem o símbolo de uma mulher trocando fralda já não é mais adequado. Miriam Leitão também discute sobre isso: “antes esse detalhe nem seria notado, hoje, contudo, as pessoas já se perguntam: por que não o pai?”.

A sociedade está recebendo mudanças importantes e significativas. Nós, designers, como propiciadores da inovação, devemos repensar nosso modo de trabalho e, sobretudo, cuidar com o que representamos, focando-se em não reproduzir o que já é inviável e obsoleto.

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Referências:

LEITÃO, Míriam. “História do Futuro — o Horizonte do Brasil No Século XXI”. 2015.

MANZINI, Ezio. Design para a inovação social e sustentabilidade. 2008.

SCHWAB, Klaus. A Quarta Revolução Industrial. 2016.

Fórum Econômico Mundial. The Future of Jobs. Disponível em: <http://www3.weforum.org/docs/WEF_Future_of_Jobs.pdf>. 2016.

Driverless car project: <https://waymo.com/>.

Novo pictograma para idosos:<http://www.meioemensagem.com.br/home/comunicacao/2013/09/30/veja-o-novo-icone-para-os-aposentados.html>.

Novo pictograma para idosos: <http://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2017/02/06/simbolo-de-preferencia-deve-respeitar-idosos-segundo-projeto-em-pauta-na-cdh>.

Novo ícone para cadeirantes: <http://accessibleicon.org/>.

As opiniões expressas no artigo são de responsabilidade do autor

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